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1.7.22

'A América Latina será vítima até se libertar do imperialismo explorador', diz Papa

 Em entrevista de mais de uma hora, Francisco também falou sobre os rumores de renúncia e a guerra na Ucrânia.

O Papa Francisco fez uma firme defesa do perfil "popular" da Igreja latino-americana e seu papel emancipador em uma região que, segundo ele, "será vítima até que seja libertada do imperialismo explorador". Em uma entrevista altamente política, concedida na semana passada à agência de notícias argentina Télam, o pontífice evitou mencionar esses "exploradores" porque, segundo ele, "são tão óbvios que todos os veem". E convidou a América Latina a pensar "na periferia" para realizar o "sonho de unidade de San Martín e Bolívar".

— Fiquei impressionado com uma palestra que ouvi de Amelia Podetti, uma filósofa que já faleceu, na qual ela disse: “A Europa viu o universo quando Magalhães chegou ao Sul”. Em outras palavras, ela entendeu a si própria a partir da periferia A periferia nos faz entender o centro. Eles podem ou não concordar, mas se você quer saber o que um povo sente, vá para a periferia. As periferias existenciais, não só as sociais. E ali o povo se mostra — disse o Papa.

Nessa periferia está a América Latina, aquele lugar onde "se vê a verdadeira realidade", segundo Francisco. A região tem então o desafio de construir a unidade a partir daí e "se libertar do imperialismo".

— A América Latina ainda está nesse caminho lento, de luta, do sonho de San Martín e Bolívar pela unidade da região. O sonho de San Martín e Bolívar é uma profecia, aquele encontro de todo o povo latino-americano além da ideologia. É isso que precisa ser trabalhado para alcançar a unidade latino-americana — disse Francisco à Télam.

Nascido na Argentina há 85 anos, Francisco se tornou o primeiro papa latino-americano em 13 de março de 2013. Desde então não voltou ao seu país, mas visitou o Brasil — sua primeira viagem ao exterior, em julho do mesmo ano — Equador, Bolívia, Paraguai, Cuba, México e Colômbia. Em todos esses países, a Igreja Católica é forte porque, disse Francisco, “tem uma história de proximidade com a população".

— É uma Igreja popular, no verdadeiro sentido da palavra. É uma Igreja que se desnaturalizou quando o povo não conseguia se expressar e acabou sendo uma Igreja de gerentes de fazendas, com agentes pastorais que mandavam — disse o Papa. — A Igreja latino-americana tem aspectos de sujeição ideológica em alguns casos. Tem e continuará tendo porque esta é uma limitação humana, mas é uma Igreja que pôde e pode expressar cada vez melhor sua organização popular.

Francisco falou durante mais de uma hora e meia e estava totalmente recuperado da artrose do joelho direito, doença que o obrigou a cancelar uma viagem marcada para o início de julho à República Democrática do Congo e ao Sudão do Sul. A suspensão das visitas desencadeou rumores de uma possível renúncia.

Questionado pela Telam se ainda havia "Papa para mais tempo", optou por uma resposta quase protocolar: "Deixe que o de cima diga". Ele estava, no entanto, muito animado durante a conversa. Falou sobre a guerra na Ucrânia, a necessidade de aproximar a política dos jovens e o fim da pandemia.

— Não podemos voltar à falsa segurança das estruturas políticas e econômicas que tínhamos antes [da Covid-19]. Assim como eu digo que você não sai da crise igual, mas que sai melhor ou pior, também digo que você não sai da crise sozinho. Ou saímos todos ou nenhum de nós sai — disse Francisco.

O Papa está ciente do poder de sua voz "dissonante", como a definiu, mas também criticou o que considerou a manipulação midiática de suas palavras.

— Se eu falo, todos dizem que “o Papa falou e disse isso”. Mas também é verdade que eles tiram uma frase do contexto e fazem você confirmar o que você não quis dizer. Por exemplo, com a guerra houve toda uma disputa sobre uma declaração que fiz em uma revista jesuíta: eu disse “não há mocinhos ou bandidos aqui” e expliquei por quê. Mas eles pegaram essa frase sozinha e disseram “o Papa não condena Putin!”. A realidade é que o estado de guerra é algo muito mais universal, mais grave, e aqui não há nem bem nem mal. Estamos todos envolvidos e é isso que temos que aprender — disse.

Em seguida, pediu uma reconsideração do conceito de “guerra justa”, aquela que justifica a reação da vítima:

— Pode haver guerra justa, há direito de se defender, mas como esse conceito é usado hoje deve ser repensado. Declarei que o uso e a posse de armas nucleares são imorais. Resolver as coisas com uma guerra é dizer não à capacidade de diálogo.

Jorge Bergoglio celebrará dez anos como Papa no próximo ano.

— Bergoglio nunca imaginou que acabaria aqui. Nunca — disse ele, lembrando como foi o dia de sua eleição.

— Vim ao Vaticano com uma mala pequena, com o que estava vestindo e um pouco mais. Ainda mais: deixei os sermões preparados para o Domingo de Ramos em Buenos Aires. Eu pensei: nenhum Papa vai tomar posse no Domingo de Ramos, então no sábado eu viajo de volta para casa. Quer dizer, eu nunca imaginei que estaria aqui.

À pergunta "como Bergoglio olharia para o Papa?”, ele respondeu:

— Acho que no fundo eu diria “coitado!”, mas não é tão trágico ser Papa.

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